Enquanto isso

De ti, quero a boca. Da boca, não só na minha boca, a

palavra que me enrede por um novo destino, sem

juras ou promessa de amor. O amor não contém

segredo. Esse, o segredo, quero contar dentro da tua

boca (o ponto de entrega), tão latente quanto o beijo.

Mais antes do beijo (promessa do que virá), antes de

tirar da tua boca o gosto das uvas para deixar o meu,

quero saborear a proposta de paixão. Quero o deleite

de saber que ecoa em teus lábios o "te quero", com

mais intensidade que qualquer querer meu sobre você.

E quando quebrar teu recorde de resistência, quando
eu for teu único paradigma, a beleza do espelho, o
gemido na madrugada, tua única urgência, o adorno
dos seus dias, assim, singular (mesmo que breve) na
tua vida, compartilhar-me-ei com você, em sua ávida
boca, sem os enfeites das palavras, somente a
selvagem linguagem do meu corpo, porque sou mais
do que lê, mais que letras tentadoras, minha rima não
combina com o abstrato, ela precisa do concreto para
vibrar. É através da boca que me revelo.

Então vem, Homem, e leva-me para perto de ti, sem
linhas que tracem a distância, nada tênue, porque
paixão, a clássica, é dedilhada numa cama, a luz
natural e com contornos reais, com sabor de pele, o
aroma da minha cereja misturada ao do teu vinho.
Leva-me ao encontro de tua boca para ouvir meu
corpo a sussurrar na ponta de tua língua, enrosca
nossos corpos, ata-desata nossos desejos e canta,
(entre os seios meus), a mais bela sinfonia e deixa
que o pensamento conduza os próximos passos
(o segredo: aqui estão os únicos plurais admissíveis).

Cherry